segunda-feira, 21 de junho de 2010


SARAMAGO E AS INTERMITÊNCIAS DA MORTE

'Não há nada no mundo mais nu que um esqueleto'
José Saramago



Já deveria ter colocado aqui minha homenagem ao escritor português José Saramago, único escritor de língua portuguesa a ganhar o Nobel de Literatura.

Mas na verdade não acho que era um grande escritor por conta disso. É incrível como por conta de sua morte, a grande mídia produz matérias que evidenciam seu ateísmo, o prêmio, seu exílio nas ilhas canárias, e muito pouco de sua obra. Portanto decidi escrever sobre um de seus livros. Talvez o que mais me despertou interesse e me excitou a uma reflexão.

A primeira vez que ouvi falar de Saramago, foi através do seu “Memorial do Convento”. Uma amiga sempre me falava dessa narrativa. Porém não o li.

Somente com “As Intermitências da Morte”, embarquei no universo filosófico e ao mesmo tempo sarcástico de sua obra.

O livro traz um espaço geográfico fabuloso, aonde a morte se cansa de sua atividade e as pessoas deixam de morrer, causando uma catástrofe social. O caos.

Assim, mesmo com hospitais superlotados, idosos e doentes sem morrer, a morte pode a qualquer momento voltar a trabalhar. E aí? Como esse país sem nome vai reaprender a morrer?

Do mesmo jeito que trabalha com a morte, o autor vai também trabalhar com a cegueira no seu “Ensaio sobre a Cegueira”, e com a lucidez no seu “Ensaio sobre a Lucidez”.

Saramago tinha um estilo discursivo totalmente distante da norma gramatical. Os diálogos dos seus personagens são colocados direto com os do narrador e têm a informalidade da linguagem oral.

Desconstruidor do discurso narrativo convencional. Com esse tipo de escrita, causa inquietação e ao mesmo tempo intimidade com o leitor. Ás vezes ao lê-lo, penso que estou a conversar com o autor.

“As intermitências da Morte” é uma obra arrebatadora. Ela mostra bem o estilo próprio do escritor português que partiu na última sexta-feira, deixando para a humanidade gotas de questionamentos profundos, vestidos de fábulas sarcásticas e irônicas. Que ao serem lidas despertam a busca por respostas de perguntas que não queremos fazer.

Stefano Ferreira. Oeiras, 21 de junho de 2010. Ao som dos sinos da matriz.

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